1. O tempo de Natal é na sua essência uma caminhada à procura de Jesus. A Jesus, bebé frágil deitado em palhas, procuram-no os anjos do céu, os pastores da terra, os sábios do oriente. Todos eles – anjos, pastores e sábios – são personagens presentes no presépio – os últimos a chegar foram, precisamente, os sábios (ou magos). Chegaram nunca antes de um ano de vida do bebé Jesus, nem nunca mais de dois anos. À sua chegada, ou melhor, a este encontro dos sábios com o Menino Jesus a liturgia cristã chama-lhe Manifestação ou Epifania, para significar que Jesus se mostra (e deseja mostrar-se) aos povos não judeus ou pagãos – isto é, a todos! A todos é mesmo a todos, todos, todos, mesmo!
2. A mais impressiva impressão que ressalta do evangelho da Festa da Epifania (Mateus 2:1-12) é a de movimento. Dois são os movimentos maiores de que ali se falam: um, o de ir em busca do Rei recém-nascido; outro, o de se saber mudar de caminho depois de O re-conhecer!
No início da longa caminhada, há no coração dos três Sábios do Oriente uma única intenção: ir em busca do Recém-nascido!
Buscar é movimento importante na dinâmica da fé. Mas, cuidado: este buscar não é jamais um buscar-se a si mesmo, antes um buscar a Jesus, o Senhor!
3. Para os judeus todos os demais povos eram (e são) pagãos. Sabedores de seguirem o único Deus verdadeiro, chamavam pagãos ou adoradores de deuses falsos aos demais crentes. É por isso que a narrativa evangélica dos magos do oriente é tão rica e simbólica, pois significa que, afinal, também os não-judeus buscaram (e buscam), e buscando, se aproximaram de Jesus. É certo que não foram os primeiros a chegar ao presépio; tal como também é certo que, apesar de virem de mais longe, eles não deixaram de ali vir! Esse é para nós o seu grande exemplo: apesar da lonjura, dos riscos e perigos da viagem, e dos possíveis enganos, eles vieram ao presépio. Vieram e até têm mais mérito por isso.
4. Aliás, o mais importante nem é se somos de longe ou de perto de Jesus, se somos membros do seu povo ou de um qualquer povo pagão; não, isso não é o mais interessante de registar. o que, a partir desta narrativa, mais apraz registar é que, no coração de todo o homem e de toda a mulher, está inscrita a ânsia de buscar a Deus! Tão certo como todos termos coração é que todo o coração tem ânsia de conhecer e buscar a Deus! Apesar do tanto que se faz, ou mais se possa fazer, para elidir os sinais que apontam para Deus, a verdade é que na terra nada há – e não há nada mesmo, mas mesmo nada! – que possa saciar o coração humano. Ou seja: por mais que o não saibamos, todos andamos em busca de Deus! Judeus ou gregos, livres ou escravos, cristãos ou pagãos, homem ou mulher, todos, todos, todos buscamos a Deus! E nada a não ser Deus nos sacia!
Encha-se o coração do que se quiser, nada o sacia como o sacia Deus! Dele arredemos Deus, sem interessar como ou para onde, que o nosso coração continuará faminto de absoluto, porque ter fome e sede de Deus é a marca mais impressiva do nosso coração. Não correm os rios para o mar? – Assim geme o nosso coração pelo infinito! Não correm os cervos sedentos em busca de águas vivas? – Assim busca o nosso coração o Deus vivo!
Eu não m’admiro nem m’espanto que aqueles sábios tenham vindo de longe para ajoelhar-se diante de uma manjedoira. Não me admiro, e por uma simples razão: onde existir um coração latindo, esse busca a Deus! Onde houver sede, há busca e inquietude por saciá-la. E não é com coca-cola nem com pipas de água que se mata tal sede. Ter um espírito inquieto, ser-se buscador, ter arrojo de lançar-se por trilhos que ninguém, ou quase ninguém trilha, é condição para que o encontro com a Fonte se dê.
5. Que podemos aprender com aqueles sábios? – A ser inquietos e a buscar! E isso é muito mais que não ficar-se parado. De facto, tinham eles a sua religião de que, aliás, eram ministros; tinham os seus dogmas, de que eram guardiães; e tinham os conhecimentos da ciência de que eram depositários e transmissores. Que sucedeu, então? Sucedeu que apercebendo-se da presença duma luz nova não ficaram instalados nem sossegados, e logo se dispuseram a partir para a seguir até encontrarem o Rei de quem ela falava.
6. Isso sim, a presença de Jesus emana luz que rompe qualquer treva. Porém, também é verdade que se uns recusam a luz, outros, as trevas. Para os que buscam a luz, a luz guia-os e deixa-se ver. Para os que a ela se fecham e a recusam para se quedarem na sombra, também a luz se lhes fecha e por eles não se deixa encontrar. Para encontrá-l’a é preciso querê-l’a, saber partir e saber buscá-l’a. Pode que a luz seja poderosa como mil sóis – e até é mais! – mas jamais vence a alguém que a não queira, nem queira por ela ser vencido e convencido!
7. Se alguém busca a luz, saiba que muito mais, e muito antes, a luz o busca a si e nos busca a cada um de nós. E não, não é preciso ser-se muito sábio, nem muito religioso para encontrar a luz – e sim, basta querer ser por ela encontrado!
8. Que, pois, nos ensina a Festa da Epifania? – Que só quem procura, encontra, e é encontrado! E ensina um pouco mais que isso: ensina que quem se encontra com a luz-Jesus (ou, por Ele é encontrado) logo depois muda de caminho. Foi, aliás, isso que sucedeu com os magos do oriente: Foram ao presépio e regressaram do presépio por outro caminho! Foram buscando por uma via de descoberta, regressaram pela do anúncio e do testemunho! Depois de encontrar e adorar a Deus não consta que tenham deixado de ser o que eram, nem sacerdotes, nem cientistas, nem sábios. E no regresso a casa continuaram sendo-o, mas diferentes; e porque diferentes, seguiram outro caminho. Não consta que já soubessem tudo, ou que deixassem de interessar-se por Aquele que uma vez haviam adorado. Não, isso não sucedeu, porque quem uma vez busca, sempre é buscador e só é buscador, pois jamais alguém se sacia com as migalhas que a terra dá!
Frei João Costa
.carmo | nº 263 | janeiro 07 2024